Para um filme ter um remake, o diretor que se propor a tal
projeto precisa estar convicto de que pode fazer melhor que o original.
Geralmente acontece quando a ideia é boa, mas o filme nem tanto, por isso a
necessidade de reciclar o roteiro, para ele não acabar sendo desperdiçado
assim, em uma produção ruim. Ou mesmo depois de tantos anos, quando a história
precisa ser reajustada aos padrões atuais, com as produtoras preocupadas em
lucrar em cima de um nome já consagrado. Porém, Quando o filme já era bom, as
chances de sair uma porcaria são grandes, já que é sabido que em clássicos não
se mexe. Ou então, quando precisamos adaptar a história para outro país, mexer
com o que funciona melhor em determinadas regiões, lembrando que nosso mundo é
dividido por seis continentes e diferentes culturas. É o caso de O Milagre da
Sela 7, filme original do cineasta sul-coreano Lee Hwan-gyeong lançado em 2013,
adaptado em uma versão turca exclusivamente para a Netflix, dirigida por Mehmet
Ada Öztekin. As duas versões conseguem ser diferentes, apesar da mesma
premissa. A primeira contrasta momentos de humor com forte carga dramática e
emocional, principalmente no que se trata a respeito de Yong-Goo (O ´´Memo``
original) e sua filha Ye-Sung, que nessa versão parece ser bem mais inocente e
desassociada da realidade que a ova, cruzando com a história de outros
personagens, como o delegado de polícia que se sensibiliza com Yong-Goo e
acredita em sua inocência, cultivando uma forte apatia com sua história de vida
e buscando fazer de tudo para ajudá-lo. Os outros detentos nem chegam a parecer
assim, tão ameaçadores, quanto na versão turca. Na última versão tudo é mais
agressivo, tem mais detalhes, e o roteiro não tem pressa a revelar a premissa
original. Sem querer dar spoiler, o final é conveniente modificado, mudando um
pouco o sentido proposto para deixar tudo mais palatável para qualquer tipo de
público, mas em ambas as versões um sacrifício foi preciso ser feito. É uma
pena a versão turca ser mais conhecida que a original, ainda é bem difícil
encontrar para assistir, mas talvez, não fosse essa refilmagem, a história e
toda sua profundidade se perderia com o tempo... e em seu país de origem.
Comparações entre produções
diferentes de um mesmo roteiro são inevitáveis, e de longe podemos nos lembrar
de alguns detalhes que às vezes não são tão detalhes assim, pois acabam sendo
capazes de mudar o sentido de certas tramas. Mas devemos lembrar que em ambas
as versões, os personagens centrais fazem grande diferença para a vida dos
detentos e dos agentes penitenciários. Na versão coreana, por exemplo, o
protagonista é acusado, além da morte da menina, de violência sexual. O ritmo é
mais ágil quanto aos fatos, mas mesmo assim o roteiro tem muita barriga,
repetição de acontecimentos e tramas paralelas. Não que na versão turca não
tivesse, mas aqui algumas tramas paralelas poderiam ser facilmente agilizadas,
sem desperdiçar tempo de tela. Porém, elas abrem caminho para o humor, drama e
sentimentalismo, como a tentativa frustrada de fuga de Yong-Hoo e sua filha, que
mesmo assim rendeu uma belíssima e metafórica cena, o tipo de coisa que faltou
na última versão. O prólogo, o epílogo, tudo bem denso, explicativo e positivo,
foram o diferencial que rendeu pontos para a primeira versão. Fora outras
coisas como a troca da personagem das mochilas desejos de consumo de Ova e
Ye-Sung (Heidi dos Andes na versão turca, e Sailor Moon na versão coreana. A
personagem Sailor Moon, aliás, ainda é bastante explorada por durante todo o
filme.), as maneiras como o pai da menina morta demonstra sua crueldade, tal
crueldade que faz a gente ter menos pena dele, e outros detalhes narrativos
modificados entre uma versão e outra, como um soldado desertor possível
testemunha, personagens usados como licença poética para livrar a pele de nosso
herói, sua avó com quem pode contar para cuidar de sua filha nessa última
versão, entre outros. O que sempre vou concordar é que, tanto em uma quanto na
outra, o personagem central está bem representado, natural em sua inocência e
maneira alegre com a qual lida com a vida. Características essas que o aproxima
ao mundo infantil e o faz ser tão amado pela filha. Diante de tanto sofrimento
que o pobre diabo encontra pela frente, o espectador acaba esquecendo-se da
garotinha que teve um triste fim levando a todos esses acontecimentos, e nisso
as duas versões mandam muito bem. O roteiro é triste, trágico, contudo, ensina
que a justiça deve ser sempre gentil ao tomar suas decisões, evitando as
erradas. E é claro, é um filme a favor da vida, contra penas punitivas de
morte, e prova que toda vida é igual. Merecem ser vistas as duas versões.